segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Natal é época que convida ao amor


O espírito do Natal convida ao encontro, ao estar "com", a fazer-se em alegria despretensiosa onde a vida em um ano, normalmente é passada a limpo, avaliada nos seus prós e contras, e dão espaço a sonhos de projetos outros, que fazem dela (a vida) ser um movimento dialético, um eterno recomeço. Com os idosos é tão mais interessante esse resultado. Não há harmonia nos passos e gestos, cada um a seu modo usufrui do encontro como uma novidade extra, distante de sua rotina de casa, idas à farmácia e ao centro de saúde, preocupação com a família, netos, filhos e com a saúde. Cada um com seu ritmo, suas crenças, seus receios, suas esperanças de viver melhor, com qualidade. Eis a palavra! Qualidade!  O encontro hoje serviu para um monte de coisas, mas essencialmente, para reafirmar a certeza de que podemos seguir por um caminho onde as pessoas não devem ser tratadas apenas com técnicas marcadas pelo dualismo cartesiano da pura e simples exatidão onde a doença e a saúde estão refugiadas. Fizemos algazarra, dançamos, falamos de coisas sérias e resgatamos brincadeiras da infância, tudo perfeito. E fizemos isso sem nenhum medo de romper com uma sintonia que teima em fragmentar nossas práticas de saúde. Fugimos da correria onde tudo converge natural e perigosamente para ações individualizadas onde cada um faz a sua parte.Quem irá reunir os mil fragmentos espalhados do que foi esfacelado num mesmo indivíduo que contemporizamos no encontro solitário dos consultórios? É esse nível de experiência do fazer em saúde que alimenta e mata a fome de uma carência própria  e que satisfaz o ser humano porque o aproxima de uma maior possibilidade de inteireza. No espaço privilegiado que alberga o grupo desponta a necessidade que todo ser humano tem, de viver coletivamente, de saber-se no outro aquilo não viu ainda em si, porque espelhos não avaliam antes de refletir a imagem, mas encontramos nos pares o olhar que nos remete ao encontro conosco também. Lemos nas histórias alheias os desejos que nos assemelha, aquilo que não experimentamos, mas que gostaríamos; nos identificamos numa fome de saber/sentir o ainda não alcançado, naquilo que está no plano do desejo e que muitas vezes, agoniza em nossa lógica linear. É justamente o fato de aceitar essa angústia como parte da condição humana que permite ao homem desenvolver-se como um ser ético; para tanto, deverá estar o tempo todo construindo o seu processo de autonomia. É o que afirma Nelson Levy (1991), preocupado em conceituar o homem como ser ao mesmo tempo desejante e ético.
A Educação em Saúde é mecanismo importante para o trabalho em grupo, que usa ferramentas que demandam ao profissional de saúde habilidades para desenvolver tarefas cujas exigências estão no campo não só das ciências biológicas e da semiologia - não cabe explicar sintomas, causas, pioras e melhoras. Exige uma maturidade para falar das relações sociais, requer aproximação com a psicologia, com as artes e com práticas alternativas, que fogem ao dia-a-dia do serviço de saúde. Ainda precisa muito ser materializada no discurso institucional que dialoga e exige até, das equipes, o desenvolvimento dessas práticas, mas no fundo, não vê o quanto de necessidade e apoio, ela carece para se tornar ação.

segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Calçada Amiga: A percepção da violência sob a ótica da comunidade



A ideia da roda de conversa é proporcionar a troca de pensamentos, opiniões, visões e leitura que  fazemos do mundo à nossa volta. É acima de tudo a busca por convergência mesmo diante do que se mostra infinitamente contraditório. O encontro hoje com a comunidade, descortinou a angústia que persegue o mundo contemporâneo: a Violência. E o cenário, curiosamente, era uma igreja. As palavras às vezes calam algo que permanece tão mais escondido dentro de nós, mas a fala do outro trás à tona aquilo que tentamos segurar, com medo de nos expor, com receio de nos revelar. Assistiu-se a um colóquio onde a violência foi triturada em pedacinhos para cada um explicar, segundo suas próprias convicções, suas causas e consequências, seus resultados e suas soluções. É complexo o manejo do tema em uma comunidade que experimenta a sensação de estar largada no mundo, desfiliada das políticas sociais que protejam os indivíduos, órfãos de governos que não olham e agem para os domínios dos cidadãos  "sócios" de uma cidade, onde nela constroem seus sonhos de vida. O embate, se assim pode-se falar quando em roda, trás também uma percepção das responsabilidades não só coletivas, mas no plano individual, nas transformações que ocorrem na estrutura e dinâmica das famílias - o jeito de lidar com os conflitos, desejos e perspectivas dos filhos jovens, a educação e edificação de valores. Houve quem defendeu a palmada como modo de conseguir deter tanta liberdade. Houve quem manifestou descrença pelo antagonismo liberdade X responsabilidade. Houve quem desejou o retorno da ditadura como meio de frear a decadência da sociedade, como medida derradeira de evitar sua destruição. Houve os que apontaram o dedo em direção a uma ferida autofágica- a estreita relação entre a violência e as drogas. Que construção pretende uma comunidade que não se mobiliza coletivamente em torno dos seus interesses? que não dialoga de maneira propositiva e com implicação de atos para o seu crescimento, seu cuidado e sua proteção? Como percorrer este campo íngreme e difícil de caminhar onde moram os desafios de se superar a negação ao afeto, ao carinho e ao amor, tão necessários para não se encontrar justificativas e benefícios em castigos físicos na educação de crianças e jovens. Para encontrar resultados que deem conta de sua composição futura como SER não desprovido de proteção? Como essa comunidade pode combinar seus desejos coletivos e realizá-los se não praticar o exercício do diálogo, da grupalidade e da generosidade de construir juntos uma maneira de convocar o poder público para retomar seu papel social, exigir dele também, esse cuidado e essa proteção que deve ser disponibilizada para todos? Não há nenhum segredo em viver, tudo recomeça agora, a partir deste instante. Aquilo que não foi construído poderá vir a ser, depende muito de como vamos nos mover, qual direção seguir, para que lado olhar e que passos essa comunidade almeja trilhar. O entendimento da violência como fator desestruturante das relações sociais passa também pela compreensão de que ela (a violência) funciona como um último recurso que tenta estabelecer o que é justo segundo a ótica de quem agride. Em geral, a violência tem uma motivação corretiva que tenta consertar o que o diálogo não foi capaz de solucionar. Portanto, sempre que houver violência é porque alguma coisa já estava errada - e é essa coisa que precisa de maiores cuidados. É essa coisa errada que precisa ser corrigida para diminuirmos os tipos de violências. São esses encontros que vão se constituindo em espaços de inúmeras possibilidades de se fazer cidadãos livres e conscientes do seu papel no mundo de interesses comuns. É essa a magia que a roda de conversa proporciona, e que tem no PESA o nome singular de CALÇADA AMIGA. Vamos teimando porque pode dar muito certo.